Apóstrofe à carne

Quando eu pego nas carnes do meu rosto,

Pressinto o fim da orgânica batalha:

— Olhos que o húmus necrófago estraçalha,

Diafragmas, decompondo-se, ao sol-posto.

E o Homem — negro e heteróclito composto,

Onde a alva flama psíquica trabalha,

Desagrega-se e deixa na mortalha

O tacto, a vista, o ouvido, o olfato e o gosto!

Carne, feixe de mônadas bastardas,

Conquanto em flâmeo fogo efêmero ardas,

A dardejar relampejantes brilhos,

Dói-me ver, muito embora a alma te acenda,

Em tua podridão a herança horrenda,

Que eu tenho de deixar para os meus filhos!

(Augusto dos Anjos. Obra completa, 1994.)

No plano formal, o poema é marcado por