A pesquisa em gramática (2) também tem seus mistérios (1) – aspectos da língua que (8) ninguém conseguiu (4) até hoje formular direito. Acho que não exagero se disser que a maioria dos fenômenos gramaticais já observados não tem uma explicação (5) satisfatória. Vejamos (12) um exemplo.

Sabemos que, em muitas frases, o sujeito exprime o ser que pratica a ação (ou, mais exatamente, que causa o evento). Isso acontece na frase: Minervina entortou meu guarda-chuva. Acontece que (14), com o verbo entortar (19), nem sempre o sujeito exprime quem pratica a ação. Se não houver objeto, isto é (6), se só houver o sujeito e o verbo, o sujeito exprime quem (22) sofre a ação, como em Meu guarda-chuva entortou. Essa frase, naturalmente (25), não significa (7) que o guarda-chuva (24) praticou a ação de entortar alguma coisa, mas que ele (23) ficou torto. Mesmo se o sujeito fosse o nome de uma pessoa (que, em princípio, poderia praticar uma ação), o efeito se verifica: Minervina entortou. Essa frase quer dizer que Minervina ficou torta, não que ela (9) entortou alguma coisa.

A mudança de significado do sujeito que vimos (13) acima acontece com muitos verbos do português (20); por exemplo, quebrar, esquentar, rasgar (28). Uma vez que é bastante regular, esse comportamento (10) deve (ou deveria) (26) ser incluído na gramática portuguesa.

Agora, o mistério: em certos casos, o fenômeno da mudança de significado do sujeito não ocorre, e ninguém sabe ao certo por quê. Assim, podemos dizer O leite esquentou, e isso significa que o leite se tornou quente, não que ele (11) esquente alguma coisa. Mas na frase Esse cobertor esquenta, entende-se (17) que o cobertor esquenta a gente (isto é, causa o aquecimento (21)), e não que ele se torne (18) quente. Ninguém sabe direito (15) por que verbos como esquentar (e vários outros (27)) não se comportam como o esperado em frases como essa. Provavelmente, o fenômeno tem a ver com a situação evocada pelo verbo. Mas falta ainda um estudo sistemático (3), e, por enquanto, esses fatos não cabem em teoria nenhuma.

Enfim, para quem gosta de certezas e seguranças, tenho más notícias: a gramática não está pronta. Para quem gosta de desafios, tenho boas notícias: a gramática não está pronta. Um mundo (16) de questões e problemas continua sem solução, à espera de novas ideias, novas análises, novas cabeças.

(Adaptado de: PERINI, M. A. Pesquisa em gramática. In: Sofrendo a gramática: ensaios sobre linguagem. São Paulo: Ática, 2000. p. 82-85.)

Considere as seguintes afirmações acerca da formação de palavras por derivação.

  1. I. Os verbos engravidar, endireitar e ensacar são formados pela adição de prefixo e sufixo a adjetivos, de modo semelhante a entortar (19).

  2. II. A adição de prefixo e sufixo pode derivar um verbo a partir de português (20).

  3. III. O substantivo aquecimento (21) é formado pela adição de um sufixo a um verbo.

Quais estão corretas?