Pede-se a quem souber do paradeiro de Luísa Porto avise sua residência à Rua Santos Óleos, 48. Previna urgente solitária mãe enferma entrevada há longos anos erma de seus cuidados. Pede-se a quem avistar Luísa Porto, 37 anos, que apareça, que escreva, que mande dizer onde está. Suplica-se ao repórter-amador, ao caixeiro, ao mata-mosquitos, ao transeunte, a qualquer do povo e da classe média, até mesmo aos senhores ricos, que tenham pena de mãe aflita e lhe restituam a filha volatilizada ou pelo menos dêem informações. É alta, magra, morena; rosto penugento, dentes alvos, sinal de nascença junto ao olho esquerdo, levemente estrábica. Vestidinho simples. Óculos. Sumida há três meses. Mãe entrevada chamando. Foi fazer compras na feira da praça.
Não voltou.

Nada de insinuações quanto à moça casta que não tinha, não tinha namorado. Algo de extraordinário terá acontecido, terremoto, chegada de rei. As ruas mudaram de rumo, para que demore tanto, é noite. Mas há de voltar, espontânea ou trazida por mão benigna, o olhar desviado e terno,
canção.

Mas se acharem que a sorte dos povos é mais importante e que não devemos atentar nas dores individuais, se fecharem ouvidos a este apelo de campainha, não faz mal, insultem a mãe de Luísa, virem a página: Deus terá compaixão da abandonada e da ausente, erguerá a enferma, e os membros perclusos já se desatam em forma de busca. Deus lhe dirá: Vai, procura tua filha, beija-a e fecha-a para sempre em teu coração. Ou talvez não seja preciso esse favor divino. A mãe de Luísa (somos pecadores) sabe-se indigna de tamanha graça. E resta a espera, que sempre é um dom. Sim, os extraviados um dia regressam, ou nunca, ou pode ser, ou ontem.
E de pensar realizamos.

(Adaptado de: ANDRADE, Carlos Drummond de. Desaparecimento de Luísa Porto. In: Novos Poemas, v. 1, de Carlos Drummond de Andrade: Nova Reunião - 19 Livros de Poesia. Rio de Janeiro: José Olympio, 1983. p. 230-234.)

Considere as seguintes afirmações, referentes à interpretação de palavras e segmentos do texto.

  1. I. O adjetivo entrevada (l. 06) tem omesmo sentido que o adjetivo perclusos(l. 48).

  2. II. As palavras volatilizada (l. 17) eSumida (l. 24) são semanticamenteequivalentes no texto.

  3. III. O segmento da abandonada e da ausente (l. 47) diz respeito ao segmentomãe de Luiza (l. 44).

Quais estão corretas?