Leia o seguinte trecho, que dá início ao conto Dançar Tango em Porto Alegre, do livro Contos Completos, de Sergio Faraco.
Carregava pouca roupa na valise. Duas camisas, uma calça grossa, meias e cuecas que me envergonhavam quando precisava pendurá-Ias para secar. Era, enfim, roupa que eu tinha, mais a do corpo e o casaco listrado que trazia nos ombros, prevenindo o frio da madrugada. Um casaco antigo, resistente, comprara-o em certa ocasião para procurar emprego em Porto Alegre. Ele durava, mas os empregos... As pessoas costumavam me demitir como contristadas: ‘O senhor trabalha devagar e é muito distraído’ ou ‘O senhor se esquece demais de suas obrigações’. Era engraçado que, depois de tantos anos, estivesse retornando à capital para tentar novo emprego e vestisse o mesmíssimo casaco. Mudava o mundo, minha roupa não.
Quase duas horas e o trem atravessava a noite escura, uma viagem sem fim, Uruguaiana a Porto Alegre era : como a volta ao mundo. Noite úmida, fria, o vidro da janela se embaciava e eu me distraía imaginando como seria, numa noite assim, ver do campo o trem passar. Devia causar algum assombro a cobra de ferro, luminosa, vomitando na treva o seu clamor de bielas rugidoras. Tinha vontade de erguer o vidro, espiar o tênder e a locomotiva numa curva da estrada [...]”
Assinale a afirmação correta sobre esse trecho.