A questão toma por base uma passagem da narrativa Numa e a Ninfa, de Afonso Henriques de Lima Barreto (1881-1922), dois fragmentos do livro O Mundo Assombrado pelos Demônios, do astrofísico norte-americano Carl Sagan (1934-1997) e o texto de uma publicidade de cigarros do início da década de 80, publicada em revista de circulação nacional.

O acolhimento que dispensou aos seus projetos o excelentíssimo senhor ministro do Fomento Nacional, animou o russo a improvisar novos processos que levantassem a pecuária no Brasil. Xandu, com o cotovelo direito sobre a mesa e a mão respectiva na testa, considerava Bogóloff com espanto e enternecido agradecimento.

- Ah! Doutor! disse ele. O senhor vai dar uma glória imortal ao meu ministério.

- Tudo isso, Excelência, é fruto de longos e acurados estudos.

Xandu continuava a olhar embevecido o russo admirável; e este aduziu com toda convicção:

- Por meio da fecundação artificial, Excelência, injetando germens de uma em outra espécie, consigo cabritos que são ao mesmo tempo carneiros e porcos que são cabritos ou carneiros, à vontade.

Xandu mudou de posição, recostou-se na cadeira; e, brincando com o monóculo, disse:

- Singular! O doutor vai fazer uma revolução nos métodos de criar! Não haverá objecções quanto à possibilidade, à viabilidade?

- Nenhuma, Excelência. Lido com as últimas descobertas da ciência e a ciência é infalível.

- Vai ser uma revolução!...

- É a mesma revolução que a química fez na agricultura. Penso assim há muitos anos, mas não me tem sido possível experimentar os meus processos por falta de meios; entretanto, em pequena escala já fiz.

- O que?

- Uma barata chegar ao tamanho de um rato.

- Oh! Mas... não tem utilidade.

- Não há dúvida. Uma experiência ao meu alcance, mas, logo que tenha meios...

- Não seja essa a dúvida. Enquanto eu for ministro, não lhe faltarão. O governo tem muito prazer em ajudar todas as tentativas nobres e fecundas para o levantamento das indústrias agrícolas.

- Agradeço muito e creia-me que ensaiarei outros planos. Tenho outras ideias!

- Outras? fez em resposta o Xandu.

- É verdade. Estudei um método de criar peixes em seco.

- Milagroso! Mas ficam peixes?

- Ficam... A ciência não faz milagres. A cousa é simples. Toda a vida veio do mar, e, devido ao resfriamento dos mares e à sua concentração salina, nas épocas geológicas, alguns dos seus habitantes foram obrigados a sair para a terra e nela criarem internamente, para a vida de suas células, meios térmicos e salinos iguais àqueles em que elas viviam nos mares, de modo a continuar perfeitamente a vida que tinham. Procedo artificialmente da forma que a cega natureza procedeu, eliminando, porém, o mais possível, o fator tempo, isto é: provoco o organismo do peixe a criar para a sua célula um meio salino e térmico igual àquele que ele tinha no mar.

- É engenhoso!

- Perfeitamente científico.

Xandu esteve a pensar, a considerar um tempo perdido, olhou o russo insistentemente por detrás do monóculo e disse:

- Não sabe o doutor como me causa admiração o arrojo de suas ideias. São originais e engenhosas e o que tisna um pouco essa minha admiração, é que elas não partam de um nacional. Não sei, meu caro doutor, como é que nós não temos desses arrojos! Vivemos terra à terra, sempre presos à rotina! Pode ir descansado que a República vai aproveitar as suas ideias que hão de enriquecer a pátria.

Ergueu-se e trouxe Bogóloff até à porta do gabinete, com o seu passo de reumático.

Dentro de dias Grégory Petróvitch Bogóloff era nomeado diretor da Pecuária Nacional.

(Afonso Henriques de Lima Barreto. Numa e a Ninfa.)

O Mundo Assombrado pelos Demônios

Sim, o mundo seria um lugar mais interessante se houvesse UFOS escondidos nas águas profundas, perto das Bermudas, devorando os navios e os aviões, ou se os mortos pudessem controlar as nossas mãos e nos escrever mensagens. Seria fascinante se os adolescentes fossem capazes de tirar o telefone do gancho apenas com o pensamento, ou se nossos sonhos vaticinassem acuradamente o futuro com uma frequência que não pudesse ser atribuída ao acaso e ao nosso conhecimento do mundo.

Esses são exemplos de pseudociência. Eles parecem usar os métodos e as descobertas da ciência, embora na realidade sejam infiéis à sua natureza — frequentemente porque se baseiam em evidência insuficiente ou porque ignoram pistas que apontam para outro caminho. Fervilham de credulidade. Com a cooperação desinformada (e frequentemente com a conivência cínica) dos jornais, revistas, editoras, rádio, televisão, produtoras de filmes e outros órgãos afins, essas ideias se tornam acessíveis em toda parte.

(...)

Não é preciso um diploma de nível superior para conhecer a fundo os princípios do ceticismo, como bem demonstram muitos compradores de carros usados que fazem bons negócios. A ideia da aplicação democrática do ceticismo é que todos deveriam ter as ferramentas essenciais para avaliar efetiva e construtivamente as alegações de quem se diz possuidor do conhecimento. O que a ciência exige é tão-somente que façamos uso dos mesmos níveis de ceticismo que empregamos ao comprar um carro usado ou ao julgar a qualidade dos analgésicos ou da cerveja pelos seus comerciais na televisão.

Mas as ferramentas do ceticismo em geral não estão à disposição dos cidadãos de nossa sociedade. Mal são mencionadas nas escolas, mesmo quando se trata da ciência, que é seu usuário mais ardoroso, embora o ceticismo continue a brotar espontaneamente dos desapontamentos da vida diária. A nossa política, economia, propaganda e religiões (Antiga e Nova Era) estão inundadas de credulidade. Aqueles que têm alguma coisa para vender, aqueles que desejam influenciar a opinião pública, aqueles que estão no poder, diria um cético, têm um interesse pessoal em desencorajar o ceticismo.

(Carl Sagan. O Mundo Assombrado pelos Demônios. Tradução de Rosaura Eichemberg.)

PREOCUPAÇÃO COM CIGARRO.

O QUE FAZER?

Quando você acende um cigarro, acende também uma preocupação?

Bem, se você anda preocupado mas gosta muito de fumar, quem sabe você muda para um cigarro de baixos teores de nicotina e alcatrão?

Quer uma idéia? Century.

Century é diferente dos outros cigarros de baixos teores, por motivos fundamentais.

Century jogou lá embaixo a nicotina e o alcatrão, mas não acabou com seu prazer de fumar.

Isto só foi possível, evidentemente, graças a uma cuidadosa seleção de fumos do mais alto grau de pureza e suavidade.

E à competência do filtro especial High Air Dilution, consagrado internacionalmente.

Não é o cigarro sob medida para você também?

Pense nisto.

(Texto de publicidade de cigarros de início da década de 80.)

No quinto parágrafo do texto de Lima Barreto ocorre a palavra "germens", paroxítona terminada em -ns, que aparece grafada corretamente sem nenhum acento gráfico. Tomando por base esta informação,

  1. A) Explique a razão pela qual se escreve no plural "germens" sem acento gráfico, enquanto a forma do singular "gérmen" recebe tal acento.

  2. B) Apresente outro vocábulo de seu conhecimento em que se observa essa mesma diferença de acentuação gráfica entre a forma do singular e a forma do plural.