Tome por base um poema do clássico português Luís Vaz de Camões (15247-1580) e a letra do foxtrote Você só... mente, escrita pelo músico brasileiro Noel de Medeiros Rosa (1910-1937).

Trovas

a uma dama que lhe jurara

sempre por seus olhos.

Quando me quer enganar

a minha bela perjura,

para mais me confirmar

o que quer certificar,

pelos seus olhos mo jura.

Como meu contentamento

todo se rege por eles,

imagina o pensamento

que se faz agravo a eles

não crer tão grão juramento.

Porém, como em casos tais

ando já visto e corrente,

sem outros certos sinais,

quanto me ela jura mais

tanto mais cuido que mente.

Então, vendo-lhe ofender

uns tais olhos como aqueles,

deixo-me antes tudo crer,

só pela não constranger

a jurar falso por eles.

(CAMÕES, Luís de. Lírica. Belo Horizonte: Editora Itatiaia; São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1982, p. 56-57.)

Você só... mente

Não espero mais você,

Pois você não aparece.

Creio que você se esquece

Das promessas que me faz...

E depois vem dar desculpas

Inocentes e banais.

E porque você bem sabe

Que em você desculpo

Muita coisa mais...

O que sei somente

É que você é um ente

Que mente inconscientemente,

Mas finalmente,

Não sei por que

Eu gosto imensamente de você.

E invariavelmente,

Sem ter o menor motivo,

Em um tom de voz altivo,

Você, quando fala, mente

Mesmo involuntariamente.

Faço cara de contente,

Pois sua maior mentira

E dizer à gente

Que você não mente.

O que sei somente

É que você é um ente

Que mente inconscientemente,

Mas finalmente,

Não sei por que

Eu gosto imensamente de você.

(In: Noel pela primeira vez. Coleção organizada por Miguel Jubran. São Paulo: MEC/FUNARTE/VELAS, 2000, Vol. 4, CD 7, faixa 01.)

A “mentira" constitui um dos temas mais recorrentes nos poemas de amor de todos os tempos, variando porém o modo como os poetas a focalizam, negando-a, rejeitando-a ou aceitando-a “em nome do amor". Em Trovas e em Você só... mente é abordado o tema da “mentira no amor". Depois de observar o desenvolvimento desse tema em ambos os poemas,

  1. A) Apresente a justificativa lógica da conclusão a que chega o eu-poemático nos últimos cinco versos do poema de Camões;

  2. B) Demonstre o caráter irônico do emprego do vocábulo “inocentes" no sexto verso da letra de Noel Rosa.