Tome por base as duas primeiras partes do conto Jeca Tatu, do escritor, editor e polemista José Bento Monteiro Lobato (1882-1948), e um fragmento do poema Juca Mulato, do jornalista e poeta modernista Paulo Menotti del Picchia (1892-1988).

Jeca Tatu

Jeca Tatu era um pobre caboclo que morava no mato, numa casinha de sapé. Vivia na maior pobreza, em companhia da mulher, muito magra e feia, e de vários filhinhos pálidos e ristes.

Jeca Tatu passava os dias de cócoras, pitando enormes cigarrões de palha, sem ânimo de fazer coisa nenhuma. Ia ao mato caçar, tirar palmitos, cortar cachos de brejaúva, mas não tinha a ideia de plantar um pé de couve atrás da casa. Perto corria um ribeirão, onde ele pescava de vez em quando uns lambaris e um ou outro bagre. E assim ia vivendo.

Dava pena ver a miséria do casebre. Nem móveis, nem roupas, nem nada que significasse comodidade. Um banquinho de três pernas, umas peneiras furadas, a espingardinha de carregar pela boca, muito ordinária, e só.

Todos que passavam por ali murmuravam:

– Que grandissíssimo preguiçoso!

(...)

Jeca só queria beber pinga e espichar-se ao sol no terreiro. Ali ficava horas, com o cachorrinho rente; cochilando. A vida que rodasse, o mato que crescesse na roça, a casa que caísse. Jeca não queria saber de nada. Trabalhar não era com ele.

Perto morava um italiano já bastante arranjado, mas que ainda assim trabalhava o dia inteiro. Por que Jeca não fazia o mesmo?

Quando lhe perguntavam isso, ele dizia:

– Não paga a pena plantar. A formiga come tudo.

– Mas como é que o seu vizinho italiano não tem formiga no sítio?

– E que ele mata.

– E por que você não faz o mesmo?

Jeca coçava a cabeça, cuspia por entre os dentes e vinha sempre com a mesma história:

– Quá! Não paga a pena...

– Além de preguiçoso, bêbado; e além de bêbado, idiota, era o que todos diziam.

(MONTEIRO LOBATO. Jeca Tatu. In: Obras completas de Monteiro Lobato. Vol 8. São Paulo: Editora Brasiliense Limitada, 1951, p. 329-331.)
Juca Mulato

Juca Mulato pensa: a vida era-lhe um nada...

Uns alqueires de chão; o cabo de uma enxada;

um cavalo pigarço; uma pinga da boa;

o cafezal verdoengo; o sol quente e inclemente...

Nessa noite, porém, parece-lhe mais quente,

o olhar indiferente,

da filha da patroa...

“Vamos, Juca Mulato, estás doido?" Entretanto,

tem a noite lunar arrepios de susto;

parece respirar a fronde de um arbusto,

o ar é como um bafo, a água corrente, um pranto.

Tudo cria uma vida espiritual, violenta.

O ar morno lhe fala; o aroma suave o tenta...

“Que diabo!" Volve aos céus as pupilas, à toa,

e vê, na lua, o olhar da filha da patroa...

Olha a mata; lá está! o horizonte lho esboça;

pressente-o em cada moita; enxerga-o em cada poça;

e ele vibra, e ele sonha, e ele anseia, impotente,

esse olhar que passou, longínquo e indiferente!

Juca Mulato cisma. Olha a lua e estremece.

Dentro dele um desejo abre-se em dor e cresce

e ele pensa, ao sentir esses sonhos ignotos,

que a alma é como uma planta, os sonhos, como brotos,

vão rebentando nela e se abrindo em floradas...

Franjam de ouro, o ocidente, as chamas das queimadas.

(MENOTTIDEL PICCHIA, Paulo. Poemas. 6 edição. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1954, p. 20-21.)

Com um discurso narrativo simples e objetivo, o narrador de Jeca Tatu nos fornece, no trecho citado, um retrato bem definido da situação vivida pela personagem em seu meio. Releia atentamente o trecho e, a seguir,

  1. A) Levando em consideração as informações do narrador, avalie a atuação de Jeca Tatu como proprietário rural;

  2. B) Indique dois adjetivos empregados no texto que sintetizam a opinião que as outras pessoas tinham sobre Jeca Tatu.