[1] Comunidade das pequenas salas de cinema, não muita gente, e a que houver tocada em cheio como o coração tocado por um dedo vibrante, tocada, a pequena assembleia humana, [4] por um sopro noturno, uma ação estelar. Não se vai lá em busca de catarse direta, mas de arrebatamento, cegueira, transe. Vão alguns em busca de beleza, dizem. É uma ciência de ritmo, [7] ciclo, luz miraculosamente regulada, uma ciência de espessura e transparência da matéria? De todos os pontos da trama luminosa, ao fundo da assembleia sentadamente muda [10] morrendo e ressuscitando segundo a respiração na noite das salas, a mão instruída nas coisas mostra, rodando quintuplamente esperta, a volta do mundo, a passagem de [13] campo a campo, fogo, ar, terra, água, éter, verdade transmutada, forma. (...) A escrita não substitui o cinema nem o imita, mas a [16] técnica do cinema, enquanto ofício propiciatório, suscita modos esferográficos de fazer e celebrar. Olhos contempladores e pensadores, mão em mãos seriais, [19] movimento, montagem da sensibilidade, música vista (ouçam também com os olhos!) (...) O arroubo é uma atenção votada às miúdas cumplicidades com o mundo, o mundo em frases, em [22] linhas fosforescentes, em texto revelado, como se diz que se revela uma fotografia ou se revela um segredo. O poema, o cinema, são inspirados porque se fundam na minúcia e no rigor [25] das técnicas da atenção ardente. Alimentamo-nos de imagens emendadas, representações conjugadas simbolicamente, pontos fortes e [28] luminosos, pensamentos bucais (...). A imagem é um ato pelo qual se transforma a realidade, é uma gramática profunda no sentido em que refere que o desejo é profundo, e profunda a
[31] morte, e a vida ressurrecta.

Herberto Helder Cinemas In: Relâmpago: Revista de Poesia n º 3, 1998, p 7-8 (com adaptações)

Com relação ao texto Cinemas, do poeta português Herberto Helder, e a aspectos a ele relacionados, julgue o item.

As redes sociais e as informações transmitidas em filmes têm um papel restrito ao entretenimento.