[1] Como é que, desvalimento de gente assim, podiam
escolher ofício de salteador? Ah, mas não eram. Que o que
acontecia era de serem só esses homens reperdidos sem
[4] salvação naquele recanto lontão de mundo, groteiros dum
sertão, os catrumanos daquelas brenhas. O Acauã que explicou,
o Acauã sabia deles. Que viviam tapados de Deus, assim
[7] nosocos. Nem não saíam dos solapos, segundo refleti, dando
cria feito bichos, em socavas. Mas por ali deviam de ter suas
casas e suas mulheres, seus meninos pequenos. Cafuas
[10] levantadas nas burgueias, em dobras de serra ou no chão das
baixadas, beira de brejo; às vezes formando mesmo arruados.
Aí plantavam suas rocinhas, às vezes não tinham gordura nem
[13] sal. Tanteei pena deles, grande pena. Como era que podiam
parecer homens de exata valentia? Eles mesmos faziam preparo
da pólvora de que tinham uso, ralado salitre das lapas,
[16] manipulando em panelas. Que era uma pólvora preta,
fedorenta, que estrondava com espalhafato, enchendo os
lugares de fumaceira. E às vezes essa pólvora bruta fazia as
[19] armas rebentarem, queimando e matando o atirador. Como era
que eles podiam brigar? Conforme podiam viver?
João Guimarães Rosa. Grande Sertão: Veredas. Rio de janeiro: Nova Aguilar, 1994, p. 544.
Tendo como referência o fragmento acima, da obra Grande Sertão: Veredas, de João Guimarães Rosa, julgue o item seguinte.
A sintaxe empregada por Guimarães Rosa em seus textos é incomum, tendo em vista que ele mescla elementos da oralidade com elementos da prosa poética.