[1] O que torna a tortura atraente é o fato de ela

funcionar. O preso não quer falar, apanha e fala. É sobre essa

simples constatação que se edifica a complexa justificativa

[4] da tortura pela funcionalidade. O que há de terrível nela é a

sua verdade. O que há de perverso nessa verdade é o sistema

lógico que nela se apoia valendo-se da compreensão, em um

[7] juízo aparentemente neutro, do conflito entre dois mundos:

o do torturador e o de sua vítima.

O poder absoluto que o torturador tem de infligir

[10] sofrimento à sua vítima transforma-se em elemento de

controle sobre o seu corpo. No meio da selva amazônica,

espancando um caboclo analfabeto que pedia ajuda divina

[13] para sustar os padecimentos, um torturador resumiria sua

onipotência embutida: “Que Deus que nada, porque Deus

aqui é nós mesmo”. A mente insubmissa torna-se vítima de

[16] sua carcaça, que é, a um só tempo, repasto do sofrimento e

presa do inimigo. A dor destrói o mundo do torturado, ao

mesmo tempo que lhe mostra outro, o do torturador, no qual

[19] não há sofrimento, mas o poder de criá-lo. Quando a vítima

se submete, conclui-se um processo em que a confissão é um

aspecto irrelevante. O preso, na sala de suplícios, troca seu

[22] mundo pelo do torturador.

Elio Gaspari. A ditadura escancarada. São Paulo: Companhia das Letras, 2002, p. 37-41 (com adaptações).

A partir dessas informações, julgue o item.

A prática conhecida como waterboarding (afogamento simulado) foi alvo de intenso debate internacional nos últimos anos, especialmente durante o final do governo George W. Bush (2001-2009), nos Estados Unidos da América. Sob o governo de George W. Bush, agentes de inteligência engajados na prevenção e investigação de atentados terroristas receberam sanção oficial para a prática do waterboarding em interrogatórios. Nesse contexto, vários dignitários oficiais, como o então vice-presidente Richard Cheney, chegaram a afirmar que o waterboarding não deveria ser considerado uma forma de tortura. Em janeiro de 2009, o recém-empossado presidente Barack Obama baniu, finalmente, a referida prática. Considerando o significado ético-político da utilização do waterboarding pelo governo Bush e em consonância com a Convenção da Organização das Nações Unidas contra a Tortura, assinale a opção correta.