Morte e vida severina

[1] Esta cova em que estás, com palmos medida

É a conta menor que tiraste em vida

É de bom tamanho, nem largo, nem fundo

[4] É a parte que te cabe deste latifúndio

Não é cova grande, é cova medida

É a terra que querias ver dividida

[7] É uma cova grande pra teu pouco defunto

Mas estarás mais ancho que estavas no mundo

É uma cova grande pra teu defunto parco

[10] Porém mais que no mundo, te sentirás largo

É uma cova grande pra tua carne pouca

Mas à terra dada não se abre a boca

[13] É a conta menor que tiraste em vida

É a parte que te cabe deste latifúndio

(É a terra que querias ver dividida)

[16] Estarás mais ancho que estavas no mundo

Mas a terra dada não se abre a boca

João Cabral de Melo Neto. Morte e vida severina. Rio de Janeiro: Sabiá, 1967 (com adaptações).

Com base no trecho de poema apresentado acima, julgue o próximo item.

A descrição da cova por meio dos segmentos “Não é cova grande” (v.5) e “É uma cova grande” (v.9) constitui um paradoxo porque essas estruturas, a frase negativa e a afirmativa, apontam para os mesmos elementos referenciais.