ELES NÃO USAM BLACK-TIE (peça teatral)

Tião - Papai ...

Otávio - Me desculpe, mas seu pai ainda não chegou. Ele deixou um recado comigo, mandou dizê pra você que ficou muito admirado, que se enganou. E pediu pra você tomá outro rumo, porque essa não é casa de fura-greve!

Tião - Eu vinha me despedir e dizer só uma coisa: não foi por covardia!

Otávio - Seu pai me falou sobre isso. Ele também procura acreditá que num foi por covardia. Ele acha que você até que teve peito. Furou a greve e disse pra todo mundo, não fez segredo. Não fez como o Jesuíno que furou a greve sabendo que tava errado. Ele acha, o seu pai, que você é ainda mais filho da mãe! Que você é um traidô dos seus companheiro e da sua classe, mas um traidô que pensa que tá certo! Não um traidô por covardia, um traidô por convicção!

Tião - Eu queria que o senhor desse um recado a meu pai ...

Otávio - Vá dizendo.

Tião - Que o filho dele não é um “filho da mãe”. Que o filho dele gosta de sua gente, mas que o filho dele tinha um problema e quis resolvê esse problema de maneira mais segura. Que o filho é um homem que quer bem!

Otávio - Seu pai vai ficá irritado com esse recado, mas eu digo. Seu pai tem outro recado pra você. Seu pai acha que a culpa de pensá desse jeito não é sua só. Seu pai acha que tem culpa ...

Tião - Diga a meu pai que ele não tem culpa nenhuma.

Otávio (perdendo o controle) - Se eu te tivesse educado mais firme, se te tivesse mostrado melhor o que é a vida, tu não pensaria em não ter confiança na tua gente ...

Tião - Meu pai não tem culpa. Ele fez o que devia. O problema é que eu não podia arriscá nada. Preferi tê o desprezo de meu pessoal pra poder querer bem, como eu quero querer, a tá arriscando a vê minha mulhé sofrê como minha mãe sofre, como todo mundo nesse morro sofre!

Otávio - Seu pai acha que ele tem culpa!

Tião - Tem culpa de nada, pai!

Otávio (num rompante) - E deixa ele acreditá nisso, se não, ele vai sofrê muito mais. Vai achar que o filho dele caiu na merda sozinho. Vai achar que o filho dele é safado de nascença. (Acalma-se repentinamente). Seu pai manda mais um recado. Diz que você não precisa aparecê mais. E deseja boa sorte pra você.

Tião - Diga a ele que vai ser assim. Não foi por covardia e não me arrependo de nada. Até um dia. (Encaminha-se para a porta.)

GUARNIERI, Gian Francesco. Eles não usam black-tie. 3 ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1984, p.108

Tião - Eu vinha me despedir e dizer só uma coisa: não foi por covardia!

Otávio - Seu pai me falou sobre isso. Ele também procura acreditá que num foi por covardia. Ele acha que você até que teve peito. Furou a greve e disse pra todo mundo, não fez segredo. Não fez como o Jesuíno que furou a greve sabendo que tava errado. Ele acha, o seu pai, que você é ainda mais filho da mãe ! Que você é um traidô dos seus companheiro e da sua classe, mas um traidô que pensa que tá certo! Não um traidô por covardia, um traidô por convicção!

Em relação ao emprego da língua portuguesa no diálogo acima, pode-se afirmar: