O sertanejo falando
A fala a nível do sertanejo engana:
as palavras dele vêm, como rebuçadas
(palavras confeito, pílula), na glace
de uma entonação lisa, de adocicada.
Enquanto que sob ela, dura e endurece
o caroço de pedra, a amêndoa pétrea,
dessa árvore pedrenta (o sertanejo)
incapaz de não se expressar em pedra.
Daí porque o sertanejo fala pouco:
as palavras de pedra ulceram a boca
e no idioma pedra se fala doloroso;
o natural desse idioma fala à força.
Daí também porque ele fala devagar:
tem de pegar as palavras com cuidado,
confeitá-las na língua, rebuçá-las;
pois toma tempo todo esse trabalho.
(João Cabral de Melo Neto, A educação pela pedra. Nova Fronteira, 1996, p. 16.)
Esse poema consta na primeira parte de A educação pela pedra, considerada pelo autor sua obra máxima. Depois de uma leitura atenta, responda.
a) Qual o contraste entre a busca da palavra e o resultado de sua execução na boca do sertanejo?
b) A que se refere, no texto, a palavra ela, no primeiro verso da segunda estrofe? Justifique sua resposta.