UNICAMP 2011 Português - Questões

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Quando vitaminas atrapalham

Consumir suplementos de vitaminas depois de praticar exercícios físicos pode reduzir a sensibilidade à insulina, o hormônio que conduz a glicose às células de todo o corpo. Temporariamente, um pouco de estresse oxidativo - processo combatido por algumas vitaminas e que danifica as células - ajuda a evitar o diabetes tipo 2, causado pela resistência à insulina, concluíram pesquisadores das universidades de Jena, na Alemanha, e Harvard, nos Estados Unidos. Desse estudo, publicado em maio na PNAS, participaram 40 pessoas, metade delas com treinamento físico prévio, metade sem. Os dois grupos foram divididos em subgrupos que tomaram ou não uma combinação de vitaminas C e E .Todos os subgrupos praticaram exercícios durante quatro semanas e passaram por exames de avaliação de sensibilidade da glicose à insulina antes e após esse período. Apenas exercícios físicos, sem doses adicionais de vitaminas, promovem a longevidade e reduzem o diabetes tipo 2. Ao contrário do que se pensava, os resultados negam que o estresse oxidativo seja um efeito colateral indesejado da atividade física vigorosa: ele é na verdade parte do mecanismo pelo qual quem se exercita é mais saudável. A conclusão é clara: nada de antioxidantes depois de correr.

(Adaptado de “Quando vitaminas atrapalham”. Revista Pesquisa FAPESP 160, p.40, junho de 2009.)

  1. a) Por se tratar de um texto de divulgação científica, apresenta recursos linguísticos próprios a esse gênero. Quais são eles? Transcreva dois trechos em que esses recursos estão presentes.

  2. b) O experimento em questão concluiu que as vitaminas atrapalham. Explique como os pesquisadores chegaram a essa conclusão.

Os dicionários de meu pai

Pouco antes de morrer, meu pai me chamou ao escritório e me entregou um livro de capa preta que eu nunca havia visto. Era o dicionário analógico de Francisco Ferreira dos Santos Azevedo. Ficava quase escondido, perto dos cinco grandes volumes do dicionário Caldas Aulete, entre outros livros de consulta que papai mantinha ao alcance da mão numa estante giratória. Isso pode te servir, foi mais ou menos o que ele então me disse, no seu falar meio grunhido. E por um bom tempo aquele livro me ajudou no acabamento de romances e letras de canções, sem falar das horas que eu o folheava à toa. Palavra puxa palavra e escarafunchar o dicionário analógico foi virando para mim um passatempo (desenfado, espairecimento, entretém, solaz, recreio, filistria). O resultado é que o livro, herdado já em estado precário, começou a se esfarelar nos meus dedos. Encostei-o na estante das relíquias ao descobrir, num sebo atrás da Sala Cecília Meireles, o mesmo dicionário em encadernação de percalina. Com esse livro escrevi novas canções e romances, decifrei enigmas, fechei muitas palavras cruzadas. E ao vê-lo dar sinais de fadiga, saí de sebo em sebo pelo Rio de Janeiro para me garantir um dicionário analógico de reserva. Encontrei dois, mas não me dei por satisfeito, fiquei viciado no negócio. Dei de vasculhar livrarias país afora, só em São Paulo adquiri meia dúzia de exemplares, e ainda rematei o último à venda na Amazon.com antes que algum aventureiro o fizesse. Eu já imaginava deter o monopólio (açambarcamento, exclusividade, hegemonia, senhorio, império) de dicionários analógicos da língua portuguesa, não fosse pelo senhor João Ubaldo Ribeiro, que ao que me consta também tem um, quiçá carcomido pelas traças (brocas, carunchos, busanos, cupins, térmitas, cáries, lagartas-rosadas, gafanhotos, bichos-carpinteiros). Hoje sou surpreendido pelo anúncio dessa nova edição do dicionário analógico de Francisco Ferreira dos Santos Azevedo. Sinto como se invadissem minha propriedade, revirassem meus baús, espalhassem aos ventos meu tesouro. Trata-se para mim de uma terrível (funesta, nefasta, macabra, atroz, abominável, dilacerante, miseranda) notícia.

(Adaptado de Francisco Buarque de Hollanda, em Francisco F. dos S. Azevedo, Dicionário Analógico da Língua Portuguesa: ideias afins/thesaurus. 2a edição atualizada e revista, Rio de Janeiro: Lexikon, 2010.)

  1. a) A partir do texto de Chico Buarque que introduz o dicionário analógico recentemente reeditado, proponha uma definição para esse tipo de dicionário.

  2. b) Mostre a partir de que pistas do texto sua definição foi elaborada.

Gramática

Composição de Sandra Peres e Luiz Tatit (Palavra Cantada)

O substantivo

É o substituto

do conteúdo

O adjetivo

É a nossa impressão sobre quase tudo

O diminutivo

É o que aperta o mundo E deixa miúdo

O imperativo

É o que aperta os outros e deixa mudo

Um homem de letras

Dizendo ideias

Sempre se inflama

Um homem de ideias

Nem usa letras

Faz ideograma

Se altera as letras

E esconde o nome

Faz anagrama

Mas se mostro o nome

Com poucas letras

É um telegrama

Nosso verbo ser

É uma identidade Mas sem projeto

E se temos verbo Com objeto

É bem mais direto

No entanto falta

Ter um sujeito

Pra ter afeto

Mas se é um sujeito

Que se sujeita

Ainda é objeto

Todo barbarismo

É o português

Que se repeliu

O neologismo

É uma palavra

Que não se ouviu

Já o idiotismo

É tudo que a língua

Não traduziu

Mas tem idiotismo

Também na fala

De um imbecil

  1. a) Nessa letra de música são atribuídos sentidos às classificações gramaticais. Escolha duas delas e explique o sentido explorado, justificando sua pertinência ou não.

  2. b) Nas duas últimas estrofes, há um deslocamento no uso de ’idiotismo’. Explique-o.

Entre Luz e Fusco

Entre luz e fusco, tudo há de ser breve como esse instante. Nem durou muito a nossa despedida, foi o mais que pôde, em casa dela, na sala de visitas, antes do acender das velas; aí é que nos despedimos de uma vez. Juramos novamente que havíamos de casar um com o outro, e não foi só o aperto de mão que selou o contrato, como no quintal, foi a conjunção das nossas bocas amorosas... talvez risque isso na impressão, se até lá não pensar de outra maneira; se pensar, fica. E desde já fica, porque, em verdade, é a nossa defesa. O que o mandamento divino quer é que não juremos em vão pelo santo nome de Deus. Eu não ia mentir ao seminário, uma vez que levava um contrato feito no próprio cartório do céu. Quanto ao selo, Deus, como fez as mãos limpas, assim fez os lábios limpos, e a malícia está antes na tua cabeça perversa que na daquele casal de adolescentes... oh! minha doce companheira da meninice, eu era puro, e puro fiquei, e puro entrei na aula de S. José, a buscar de aparência a investidura sacerdotal, e antes dela a vocação. Mas a vocação eras tu, a investidura eras tu.

(Machado de Assis, Dom Casmurro. Cotia: Ateliê Editorial, 2008, p. 195-196.)

  1. a) Em que medida a imagem presente no título desse capítulo de Dom Casmurro define a natureza da narrativa do romance?

  2. b) No emprego da segunda pessoa, não há coincidência do interlocutor. Indique duas marcas linguísticas que evidenciam essa não coincidência, explicitando qual é o interlocutor em cada caso.

Poética I

De manhã, escureço

De dia, tardo

De tarde anoiteço

De noite ardo

A oeste a morte

Contra quem vivo

Do sul cativo

O este é meu norte.

Outros que contem

Passo por passo

Eu morro ontem

Nasço amanhã

Tudo onde há espaço.

– Meu tempo é quando.

Nova York, 1950

(Vinicius de Moraes, Antologia poética. São Paulo: Companhia das Letras, 2009, p.272.)

  1. a) A poesia é um lugar privilegiado para constatarmos que a língua é muito mais produtiva do que preveem as normas gramaticais. Isso é particularmente visível no modo como o poema explora os marcadores temporais e espaciais. Comente dois exemplos presentes no poema que confirmem essa afirmação.

  2. b) As duas últimas estrofes apresentam uma oposição entre o eu lírico e os outros. Explique o sentido dessa oposição.

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