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Examine a charge do cartunista argentino Quino (1932- ).

(Quino. Potentes, prepotentes e impotentes, 2003.)

A charge explora, sobretudo, a oposição


Seu Afredo (ele sempre subtraía o “l” do nome, ao se apresentar com uma ligeira curvatura: “Afredo Paiva, um seu criado...”) tornou-se inesquecível à minha infância porque tratava-se muito mais de um linguista que de um encerador. Como encerador, não ia muito lá das pernas. Lembro-me que, sempre depois de seu trabalho, minha mãe ficava passeando pela sala com uma flanelinha debaixo de cada pé, para melhorar o lustro. Mas, como linguista, cultor do vernáculo (1) e aplicador de sutilezas gramaticais, seu Afredo estava sozinho.

Tratava-se de um mulato quarentão, ultrarrespeitador, mas em quem a preocupação linguística perturbava às vezes a colocação pronominal. Um dia, numa fila de ônibus, minha mãe ficou ligeiramente ressabiada (2) quando seu Afredo, casualmente de passagem, parou junto a ela e perguntou-lhe à queima-roupa, na segunda do singular:

- Onde vais assim tão elegante?

Nós lhe dávamos uma bruta corda. Ele falava horas a fio, no ritmo do trabalho, fazendo os mais deliciosos pedantismos que já me foi dado ouvir. Uma vez, minha mãe, em meio à lide (3) caseira, queixou-se do fatigante ramerrão (4) do trabalho doméstico. Seu Afredo virou-se para ela e disse:

- Dona Lídia, o que a senhora precisa fazer é ir a um médico e tomar a sua quilometragem. Diz que é muito bão.

De outra feita, minha tia Graziela, recém-chegada de fora, cantarolava ao piano enquanto seu Afredo, acocorado perto dela, esfregava cera no soalho. Seu Afredo nunca tinha visto minha tia mais gorda. Pois bem: chegou-se a ela e perguntou-lhe:

- Cantas?

Minha tia, meio surpresa, respondeu com um riso amarelo:

- É, canto às vezes, de brincadeira...

Mas, um tanto formalizada, foi queixar-se a minha mãe, que lhe explicou o temperamento do nosso encerador:

- Não, ele é assim mesmo. Isso não é falta de respeito, não. É excesso de... gramática.

Conta ela que seu Afredo, mal viu minha tia sair, chegou-se a ela com ar disfarçado e falou:

- Olhe aqui, dona Lídia, não leve a mal, mas essa menina, sua irmã, se ela pensa que pode cantar no rádio com essa voz, ‘tá redondamente enganada. Nem em programa de calouro!

E, a seguir, ponderou:

- Agora, piano é diferente. Pianista ela é!

E acrescentou:

- Eximinista pianista!

(Para uma menina com uma flor, 2009.)

(1)vernáculo: a língua própria de um país; língua nacional.

(2)ressabiado: desconfiado.

(3)lide: trabalho penoso, labuta.

(4)ramerrão: rotina.

Na crônica, o personagem seu Afredo é descrito como uma pessoa


Seu Afredo (ele sempre subtraía o “l” do nome, ao se apresentar com uma ligeira curvatura: “Afredo Paiva, um seu criado...”) tornou-se inesquecível à minha infância porque tratava-se muito mais de um linguista que de um encerador. Como encerador, não ia muito lá das pernas. Lembro-me que, sempre depois de seu trabalho, minha mãe ficava passeando pela sala com uma flanelinha debaixo de cada pé, para melhorar o lustro. Mas, como linguista, cultor do vernáculo (1) e aplicador de sutilezas gramaticais, seu Afredo estava sozinho.

Tratava-se de um mulato quarentão, ultrarrespeitador, mas em quem a preocupação linguística perturbava às vezes a colocação pronominal. Um dia, numa fila de ônibus, minha mãe ficou ligeiramente ressabiada (2) quando seu Afredo, casualmente de passagem, parou junto a ela e perguntou-lhe à queima-roupa, na segunda do singular:

- Onde vais assim tão elegante?

Nós lhe dávamos uma bruta corda. Ele falava horas a fio, no ritmo do trabalho, fazendo os mais deliciosos pedantismos que já me foi dado ouvir. Uma vez, minha mãe, em meio à lide (3) caseira, queixou-se do fatigante ramerrão (4) do trabalho doméstico. Seu Afredo virou-se para ela e disse:

- Dona Lídia, o que a senhora precisa fazer é ir a um médico e tomar a sua quilometragem. Diz que é muito bão.

De outra feita, minha tia Graziela, recém-chegada de fora, cantarolava ao piano enquanto seu Afredo, acocorado perto dela, esfregava cera no soalho. Seu Afredo nunca tinha visto minha tia mais gorda. Pois bem: chegou-se a ela e perguntou-lhe:

- Cantas?

Minha tia, meio surpresa, respondeu com um riso amarelo:

- É, canto às vezes, de brincadeira...

Mas, um tanto formalizada, foi queixar-se a minha mãe, que lhe explicou o temperamento do nosso encerador:

- Não, ele é assim mesmo. Isso não é falta de respeito, não. É excesso de... gramática.

Conta ela que seu Afredo, mal viu minha tia sair, chegou-se a ela com ar disfarçado e falou:

- Olhe aqui, dona Lídia, não leve a mal, mas essa menina, sua irmã, se ela pensa que pode cantar no rádio com essa voz, ‘tá redondamente enganada. Nem em programa de calouro!

E, a seguir, ponderou:

- Agora, piano é diferente. Pianista ela é!

E acrescentou:

- Eximinista pianista!

(Para uma menina com uma flor, 2009.)

(1)vernáculo: a língua própria de um país; língua nacional.

(2)ressabiado: desconfiado.

(3)lide: trabalho penoso, labuta.

(4)ramerrão: rotina.

Em “Mas, como linguista, cultor do vernáculo e aplicador de sutilezas gramaticais, seu Afredo estava sozinho. ” (1), o cronista sugere que seu Afredo


Seu Afredo (ele sempre subtraía o “l” do nome, ao se apresentar com uma ligeira curvatura: “Afredo Paiva, um seu criado...”) tornou-se inesquecível à minha infância porque tratava-se muito mais de um linguista que de um encerador. Como encerador, não ia muito lá das pernas. Lembro-me que, sempre depois de seu trabalho, minha mãe ficava passeando pela sala com uma flanelinha debaixo de cada pé, para melhorar o lustro. Mas, como linguista, cultor do vernáculo (1) e aplicador de sutilezas gramaticais, seu Afredo estava sozinho.

Tratava-se de um mulato quarentão, ultrarrespeitador, mas em quem a preocupação linguística perturbava às vezes a colocação pronominal. Um dia, numa fila de ônibus, minha mãe ficou ligeiramente ressabiada (2) quando seu Afredo, casualmente de passagem, parou junto a ela e perguntou-lhe à queima-roupa, na segunda do singular:

- Onde vais assim tão elegante?

Nós lhe dávamos uma bruta corda. Ele falava horas a fio, no ritmo do trabalho, fazendo os mais deliciosos pedantismos que já me foi dado ouvir. Uma vez, minha mãe, em meio à lide (3) caseira, queixou-se do fatigante ramerrão (4) do trabalho doméstico. Seu Afredo virou-se para ela e disse:

- Dona Lídia, o que a senhora precisa fazer é ir a um médico e tomar a sua quilometragem. Diz que é muito bão.

De outra feita, minha tia Graziela, recém-chegada de fora, cantarolava ao piano enquanto seu Afredo, acocorado perto dela, esfregava cera no soalho. Seu Afredo nunca tinha visto minha tia mais gorda. Pois bem: chegou-se a ela e perguntou-lhe:

- Cantas?

Minha tia, meio surpresa, respondeu com um riso amarelo:

- É, canto às vezes, de brincadeira...

Mas, um tanto formalizada, foi queixar-se a minha mãe, que lhe explicou o temperamento do nosso encerador:

- Não, ele é assim mesmo. Isso não é falta de respeito, não. É excesso de... gramática.

Conta ela que seu Afredo, mal viu minha tia sair, chegou-se a ela com ar disfarçado e falou:

- Olhe aqui, dona Lídia, não leve a mal, mas essa menina, sua irmã, se ela pensa que pode cantar no rádio com essa voz, ‘tá redondamente enganada. Nem em programa de calouro!

E, a seguir, ponderou:

- Agora, piano é diferente. Pianista ela é!

E acrescentou:

- Eximinista pianista!

(Para uma menina com uma flor, 2009.)

(1)vernáculo: a língua própria de um país; língua nacional.

(2)ressabiado: desconfiado.

(3)lide: trabalho penoso, labuta.

(4)ramerrão: rotina.

Um traço característico do gênero crônica, visível no texto de Vinicius de Moraes, é


Seu Afredo (ele sempre subtraía o “l” do nome, ao se apresentar com uma ligeira curvatura: “Afredo Paiva, um seu criado...”) tornou-se inesquecível à minha infância porque tratava-se muito mais de um linguista que de um encerador. Como encerador, não ia muito lá das pernas. Lembro-me que, sempre depois de seu trabalho, minha mãe ficava passeando pela sala com uma flanelinha debaixo de cada pé, para melhorar o lustro. Mas, como linguista, cultor do vernáculo (1) e aplicador de sutilezas gramaticais, seu Afredo estava sozinho.

Tratava-se de um mulato quarentão, ultrarrespeitador, mas em quem a preocupação linguística perturbava às vezes a colocação pronominal. Um dia, numa fila de ônibus, minha mãe ficou ligeiramente ressabiada (2) quando seu Afredo, casualmente de passagem, parou junto a ela e perguntou-lhe à queima-roupa, na segunda do singular:

- Onde vais assim tão elegante?

Nós lhe dávamos uma bruta corda. Ele falava horas a fio, no ritmo do trabalho, fazendo os mais deliciosos pedantismos que já me foi dado ouvir. Uma vez, minha mãe, em meio à lide (3) caseira, queixou-se do fatigante ramerrão (4) do trabalho doméstico. Seu Afredo virou-se para ela e disse:

- Dona Lídia, o que a senhora precisa fazer é ir a um médico e tomar a sua quilometragem. Diz que é muito bão.

De outra feita, minha tia Graziela, recém-chegada de fora, cantarolava ao piano enquanto seu Afredo, acocorado perto dela, esfregava cera no soalho. Seu Afredo nunca tinha visto minha tia mais gorda. Pois bem: chegou-se a ela e perguntou-lhe:

- Cantas?

Minha tia, meio surpresa, respondeu com um riso amarelo:

- É, canto às vezes, de brincadeira...

Mas, um tanto formalizada, foi queixar-se a minha mãe, que lhe explicou o temperamento do nosso encerador:

- Não, ele é assim mesmo. Isso não é falta de respeito, não. É excesso de... gramática.

Conta ela que seu Afredo, mal viu minha tia sair, chegou-se a ela com ar disfarçado e falou:

- Olhe aqui, dona Lídia, não leve a mal, mas essa menina, sua irmã, se ela pensa que pode cantar no rádio com essa voz, ‘tá redondamente enganada. Nem em programa de calouro!

E, a seguir, ponderou:

- Agora, piano é diferente. Pianista ela é!

E acrescentou:

- Eximinista pianista!

(Para uma menina com uma flor, 2009.)

(1)vernáculo: a língua própria de um país; língua nacional.

(2)ressabiado: desconfiado.

(3)lide: trabalho penoso, labuta.

(4)ramerrão: rotina.

“[Seu Afredo] perguntou-lhe à queima-roupa, na segunda do singular:

- Onde vais assim tão elegante? ” ($2/3^\circ$ parágrafo)

Ao se adaptar este trecho para o discurso indireto, o verbo “vais” assume a seguinte forma:


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