ENEM 2002 Português - Questões
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Miguilim
“De repente lá vinha um homem a cavalo. Eram dois. Um senhor de fora, o claro de roupa. Miguilim saudou, pedindo a bênção. O homem trouxe o cavalo cá bem junto. Ele era de óculos, corado, alto, com um chapéu diferente, mesmo.
— Deus te abençoe, pequenino. Como é teu nome?
— Miguilim. Eu sou irmão do Dito.
— E o seu irmão Dito é o dono daqui?
— Não, meu senhor. O Ditinho está em glória.
O homem esbarrava o avanço do cavalo, que era zelado, manteúdo, formoso como nenhum outro. Redizia:
— Ah, não sabia, não. Deus o tenha em sua guarda... Mas que é que há, Miguilim?
Miguilim queria ver se o homem estava mesmo sorrindo para ele, por isso é que o encarava.
— Por que você aperta os olhos assim? Você não é limpo de vista? Vamos até lá. Quem é que está em tua casa?
— É Mãe, e os meninos...
Estava Mãe, estava tio Terez, estavam todos. O senhor alto e claro se apeou. O outro, que vinha com ele, era um camarada.
O senhor perguntava à Mãe muitas coisas do Miguilim. Depois perguntava a ele mesmo: — ‘Miguilim, espia daí: quantos dedos da minha mão você está enxergando? E agora?’ ”
ROSA, João Guimarães. Manuelzão e Miguilim. 9ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984.
Esta história, com narrador observador em terceira pessoa, apresenta os acontecimentos da perspectiva de Miguilim. O fato de o ponto de vista do narrador ter Miguilim como referência, inclusive espacial, fica explicitado em:
Érico Veríssimo relata, em suas memórias, um episódio da adolescência que teve influência significativa em sua carreira de escritor.
“Lembro-me de que certa noite — eu teria uns quatorze anos, quando muito — encarregaram-me de segurar uma lâmpada elétrica à cabeceira da mesa de operações, enquanto um médico fazia os primeiros curativos num pobre-diabo que soldados da Polícia Municipal haviam “carneado”. (...) Apesar do horror e da náusea, continuei firme onde estava, talvez pensando assim: se esse caboclo pode aguentar tudo isso sem gemer, por que não hei de poder ficar segurando esta lâmpada para ajudar o doutor a costurar esses talhos e salvar essa vida? (...)
Desde que, adulto, comecei a escrever romances, tem-me animado até hoje a ideia de que o menos que o escritor pode fazer, numa época de atrocidades e injustiças como a nossa, é acender a sua lâmpada, fazer luz sobre a realidade de seu mundo, evitando que sobre ele caia a escuridão, propícia aos ladrões, aos assassinos e aos tiranos. Sim, segurar a lâmpada, a despeito da náusea e do horror. Se não tivermos uma lâmpada elétrica, acendamos o nosso toco de vela ou, em último caso, risquemos fósforos repetidamente, como um sinal de que não desertamos nosso posto.”
VERÍSSIMO, Érico. Solo de Clarineta. Tomo I. Porto Alegre: Editora Globo, 1978.
Neste texto, por meio da metáfora da lâmpada que ilumina a escuridão, Érico Veríssimo define como uma das funções do escritor e, por extensão, da literatura,
“Narizinho correu os olhos pela assistência. Não podia haver nada mais curioso. Besourinhos de fraque e flores na lapela conversavam com baratinhas de mantilha e miosótis nos cabelos. Abelhas douradas, verdes e azuis falavam mal das vespas de cintura fina — achando que era exagero usarem coletes tão apertados. Sardinhas aos centos criticavam os cuidados excessivos que as borboletas de toucados de gaze tinham com o pó das suas asas. Mamangavas de ferrões amarrados para não morderem. E canários cantando, e beija-flores beijando flores, e camarões camaronando, e caranguejos caranguejando, tudo que é pequenino e não morde, pequeninando e não mordendo. ”
LOBATO, Monteiro. Reinações de Narizinho. São Paulo: Brasiliense, 1947.
No último período do trecho, há uma série de verbos no gerúndio que contribuem para caracterizar o ambiente fantástico descrito. Expressões como “camaronando”, “caranguejando” e “pequeninando e não mordendo” criam, principalmente, efeitos de
Em 1958, a seleção brasileira foi campeã mundial pela primeira vez. O texto foi extraído da crônica "A alegria de ser brasileiro", do dramaturgo Nelson Rodrigues, publicada naquele ano pelo jornal Última Hora.
“Agora, com a chegada da equipe imortal, as lágrimas rolam. Convenhamos que a seleção as merece. Merece por tudo: não só pelo futebol, que foi o mais belo que os olhos mortais já contemplaram, como também pelo seu maravilhoso índice disciplinar. Até este Campeonato, o brasileiro julgava-se um cafajeste nato e hereditário. Olhava o inglês e tinha-lhe inveja. Achava o inglês o sujeito mais fino, mais sóbrio, de uma polidez e de uma cerimônia inenarráveis. E, súbito, há o Mundial. Todo mundo baixou o sarrafo no Brasil. Suecos, britânicos, alemães, franceses, checos, russos, davam botinadas em penca. Só o brasileiro se mantinha ferozmente dentro dos limites rígidos da esportividade. Então, se verificou o seguinte: o inglês, tal como o concebíamos, não existe. O único inglês que apareceu no Mundial foi o brasileiro. Por tantos motivos, vamos perder a vergonha (...), vamos sentar no meio-fio e chorar. Porque é uma alegria ser brasileiro, amigos”.
Além de destacar a beleza do futebol brasileiro, Nelson Rodrigues quis dizer que o comportamento dos jogadores dentro do campo
“A palavra tatuagem é relativamente recente. Toda a gente sabe que foi o navegador Cook que a introduziu no Ocidente, e esse escrevia tattou, termo da Polinésia de tatou ou tu tahou, ‘desenho’. (...) Desde os mais remotos tempos, vemo-la a transformar-se: distintivo honorífico entre uns homens, ferrete de ignomínia entre outros, meio de assustar o adversário para os bretões, marca de uma classe de selvagens das ilhas marquesas (...) sinal de amor, de desprezo, de ódio (...). Há três casos de tatuagem no Rio, completamente diversos na sua significação moral: os negros, os turcos com o fundo religioso e o bando de meretrizes, dos rufiões e dos humildes, que se marcam por crime ou por ociosidade.”
RIO, João do. “Os Tatuadores”. Revista Kosmos. 1904, apud: A alma encantadora das ruas. São Paulo: Cia das Letras, 1999.
Com base no texto são feitas as seguintes afirmações:
I. João do Rio revela como a tatuagem já estava presente na cidade do Rio de Janeiro, pelo menos desde o início do século XX, e era mais utilizada por alguns setores da população.
II. A tatuagem, de origem polinésia, difundiu-se no ocidente com a característica que permanece até hoje: utilização entre os jovens com função estritamente estética.
III. O texto mostra como a tatuagem é uma prática que se transforma no tempo e que alcança inúmeros sentidos nos diversos setores das sociedades e para as diferentes culturas.
Está correto o que se afirma apenas em
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